23 abril, 2009

Uma criança sem mãe

O menino abandonado não me abandonou. Entrou dentro de mim e mora comigo. Me faz sofrer. Me dá ternura. Sempre que vejo uma criança abandonada, eu sofro. Quereria protegê-la, cuidar dela. Eu me enterneço porque a criança abandonada que mora em mim está sofrendo. Afinal, todos somos crianças abandonadas.

Nos momentos de solidão noturna, de insônia, tomamos consciência de que estamos destinados ao abandono, àquele tempo quando será inútil chamar "meu pai" ou "minha mãe".

Os negros norte-americanos conheciam esse sentimento. E com ele compuseram um spiritual em ritmo de canção de ninar que diz assim:

Por vezes eu me sinto como uma criança sem mãe,
por vezes eu me sinto como uma criança sem mãe,
longe, muito longe de casa...

É assim que me sinto, às vezes. Tenho, então, vontade de chorar...

Rubem Alves em "Se eu pudesse viver minha vida novamente"

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