Que são a imitação e o jogo de espelhos o vento a inflamar a tentação o texto deixa claro através de inúmeras pistas internas. Nenhuma, porém, é mais clara do que o depoimento da serpente: “[quando transgredirem] vocês serão como Deus”. A motivação do pecado é a mesma da virtude, o desejo de imitar a divindade.
Nessa sedução da serpente a narrativa deixa patente o mecanismo mais secreto e mais evidente da vontade humana. Num sentido muito fundamental (e ao contrário do que comumente se pensa), não desejamos aquilo que não temos e não temos qualquer inclinação natural a violar uma proibição. A privação e a interdição não bastam para desencadear a transgressão, porque as coisas a que não temos acesso por si mesmas não nos interessam. O que almejamos de forma irresistível é imitar o próximo. O que nos impele a desejar as coisas que não temos é a sede de ser como os outros. O primeiro homem não deseja o fruto da árvore, mas deseja ser como Deus.
Queremos em tudo imitar o próximo, pelo que nossos desejos se orientam pelo que as outras pessoas possuem, mas o que nos interessa em especial é imitar os desejos do próximo. Nosso plano-mestre é tornar nossas as ânsias dos outros, a fim de que compartilhemos vicariamente da satisfação que pertence a eles. Assim o que começa em admiração, se deixado a seus próprios recursos, termina fatalmente em rivalidade e antagonismo.
Paulo Brabo
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