24 fevereiro, 2009

Sem as sandálias da covardia


Um casal se aproximou de mim imediatamente após o culto. Aquela era sua primeira visita à igreja, e, segundo disseram, haviam realmente gostado. Mas eles tinham uma pergunta. Você pode imaginar a respeito de quê? Não era sobre a transubstanciação, nem a respeito do falar em línguas, tampouco acerca da inerrância das Escrituras ou sobre a escatologia; mas era qual a posição de nossa igreja em relação à homossexualidade.

Aquela “voz calma e pequena” me disse no meu íntimo para não responder nada. Ao invés disso, indaguei: “Por que esta pergunta é tão importante para vocês?”. “É uma longa história”, ele respondeu com uma risada. A jovem, no entanto, explicou: “Esta é a primeira vez que eu e meu noivo participamos de um culto cristão, pois fomos criados como agnósticos”. Imaginei então que eles eram como a maioria dos jovens adultos que conheço – que não gostariam de participar de uma organização anti-homossexual, assim como não gostariam de tomar parte em uma associação racista ou terrorista.

Geralmente, sou indagado sobre este assunto por cristãos conservadores querendo ter certeza de que nos conformamos ao que costumo chamar de “radio-ortodoxia”, que é o conjunto de prioridades de caráter político-religiosas ditadas por aclamados comunicadores evangélicos de rádio e televisão. Com menor freqüência, também sou indagado por ex-gays que buscam saber se receberão apoio em seu contínuo processo de reorientação sexual ou por pais cujos filhos recentemente “saíram do armário”.

Minha hesitação em responder a pergunta do casal tinha um por quê. Ela se justifica não por eu calçar as sandálias da covardia, mas por eu ser um pastor, que – como os demais pastores – aprendeu com Jesus que há mais em jogo ao se responder a uma pergunta do que simplesmente estar correto ou ser honesto: é preciso também manter uma atitude... pastoral. Isto significa compreender a pergunta que há por trás da pergunta, a necessidade, o medo ou o pressuposto que motiva a pergunta propriamente dita. Nós pastores queremos emoldurar nossa resposta a partir dessa necessidade; nós queremos nos alinhar à obra que o Espírito Santo está realizando na vida daquela pessoa naquele momento em particular. Para colocar em termos bíblicos: queremos nos certificar de que nossas respostas são “temperadas com sal” e apropriadas “às necessidades do momento” (Colossenses 4; Efésios 4).

A maioria dos líderes emergentes que eu conheço compartilha minha agonia em relação à questão da homossexualidade. Nosso temor funda-se na suspeita de que a discussão tenha sido manipulada muito além do que nos damos conta por partidos políticos interessados em diminuir o eleitorado de seus oponentes. De fato, temos percebido que qualquer coisa que digamos acaba sendo sugada para dentro do turbilhão de uma retórica política da guerra cultural – e nós somos pastores, evangelistas, plantadores de igreja e discipuladores, portanto, guerreiros de outro tipo de batalha. Aqueles que nos trazem essas perguntas são pessoas com as quais nos importamos e desejamos ajudar em nome de Cristo e não inimigos político-culturais a quem estamos tentando derrotar.

Francamente, muitos de nós não sabemos o que pensar sobre a homossexualidade. Temos ouvido os dois lados, mas nenhuma posição conquistou ainda nossa confiança a ponto de podermos dizer “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”. Isso certamente nos distancia tanto de liberais quanto de conservadores, os quais parecem saber exatamente como deveríamos pensar. Mesmo que estejamos convencidos de que todo comportamento homossexual é sempre pecaminoso, ainda queremos tratar gays e lésbicas com mais dignidade, gentileza e respeito do que nossos colegas tratam. Se pensamos que talvez realmente haja um contexto legítimo para algumas relações homossexuais, sabemos, por outro lado, que os argumentos bíblicos são sutis e possuem múltiplas camadas, e que suas ramificações pastorais são surpreendentemente complexas. Não estamos certos se existem linhas divisórias a serem desenhadas nem aonde desenhá-las. Tampouco sabemos como observar com justiça quaisquer linhas que porventura venhamos a traçar.

Talvez precisemos de uma moratória que nos isente de fazer pronunciamentos por cinco anos. Durante este tempo, praticaremos o diálogo cristão permeado pela oração, a escuta atenta e o discordar concordante (isto é, um discordar que acontece sobre um acordo mínimo de amor, tolerância e humildade como requer a complexidade do tema). Quando decisões tiverem de ser tomadas, serão em caráter confessadamente provisório. Manteremos nossos ouvidos antenados aos resultados das pesquisas de biblistas, teólogos, eticistas, psicólogos, geneticistas, sociólogos e ainda outros profissionais de diferentes domínios do saber. Então, após cinco anos, se tivermos clareza, nos pronunciaremos; se não, estabeleceremos outros cinco anos para reflexão contínua. Afinal, várias questões importantes na história da igreja levaram séculos para serem discernidas. Talvez essa moratória nos ajudasse a resistir aos “ventos de doutrina” que furiosamente sopram da esquerda e da direita a fim de que possamos pacientemente esperar pelo sopro do Espírito que indicará o caminho a seguir.

Mais tarde naquela semana, eu me encontrei com o novo casal para escutar sua história. “É meio estranha a maneira como tudo começou”, eles disseram. “Sabe, nós nos conhecemos no ano passado através de nossos pais que se tornaram... parceiros. Quando nos casarmos, queremos ter certeza de que eles serão bem-vindos em nosso casamento. Este foi o motivo pelo qual fizemos aquela pergunta no domingo”.

Bem-vindos ao nosso mundo onde estar “correto” ou “com a razão” não é suficiente. Também precisamos ser sábios, amorosos e pacientes. Talvez nada, aquém disto, deva “parecer bem ao Espírito Santo e a nós”.

Brian McLaren - fundou e foi por muitos anos pastor da Cedar Ridge Community Church na região próxima de Washington D.C., e agora é palestrante e escritor.

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