16 maio, 2008

Um Deus brasileiro

Conheci um homem, a quem chamarei de Nilson, a fim de preservar-lhe a identidade, que era ou é um brasileiro típico. Ele era malandro, procrastinador, enganador, vagabundo, infiel, egoísta, mentiroso, golpista, mas extremamente simpático, gostava de samba, batucada, mulheres, futebol, bebia bem e dava umas cheiradas, também, andava bem vestido e sempre estava acompanhado de seguidores, além de sua amante. Depois de um tempo, conclui que o Nilson era um brasileiro típico. Eu em minha moralidade cristã fajuta, me distanciei de nossa cultura exótica e peculiar. Entretanto, ninguém que eu tenha conhecido incorporava nossos “valores” mais autenticamente do que ele. Sempre que desejava jogar a culpa em alguém por minhas falácias, eu dizia: isso eu aprendi com o mestre Nilson. Me achava parecido com Deus e ele com o capeta.

Os anos passaram e nunca mais vi ou tive notícia do Nilson. Em minhas lutas com Deus, comecei a perceber uma mudança no caráter do divino. No Antigo Testamento ele era aquele Deus forte, guerreiro, intransigente, mandava matar seus inimigos e detratores, enfim , era um Deus arretado. No Novo Testamento, Jesus veio e acabou com a fama do Deus mau e carrancudo. Anunciou que era filho do chefe e deixou claro conhecê-lo melhor do que ninguém e tornou Deus paternal, amoroso, condescendente, perdoador e misericordioso.

Em nossos dias, fomos apresentados por padres, pastores e sacerdotes a um Deus capaz de responder orações, curar nossas enfermidades, resolver nossos problemas financeiros, materiais e emocionais. Durante um tempo acreditei nesse Deus porque funcionava, de certa forma e podia dizer aos outros que Deus era realmente legal. Não sei se foi isso, mas percebi que com a chegada do novo milênio, já no fim do século e milênio passados, Deus mudou.

Talvez tenha sido chamado às terras brasileiras e aos conclames verde-amarelos, em demasia, ou sei lá o que, mas o magnânimo começou a ficar brasileiro, conforme previra o profeta nacional Nostrapeledamus. Passou a não responder mais como antigamente. Quando ligamos para o celular dele, só cai na caixa postal. Quando conseguimos pegá-lo pelo telefone fixo ele manda dizer que está em reunião. Vive em férias. A frase que mais escutamos quando o procuramos é: foi pescar e não tem previsão para voltar. De repente, as escolas de samba, os sambistas, o mundo do futebol passaram a ser abençoados, mesmo sem pedir nada. O PT ganhou a eleição e a re-eleição e parece que vai perpetuar-se no poder. Tudo indica que, à nossa revelia, Deus aprova o Bolsa Família, esse governo charfundado em corrupções e maracutaias, mentiroso, golpista, mas simpático ao povo de baixa renda. Enfim, um povo abençoado por Deus e bonito por natureza.

Claro que eu não me incluo nessas bençãos. Não estou entre o povo de baixa renda e sob as benesses desse novo Deus. Pertenço a outro grupo, aos sem renda alguma, crente no Deus anunciado por Jesus Cristo, mas que parece não existir mais. Estou abandonado à minha própria sorte e a deriva.

Essa madrugada, enquanto orava à moda antiga, solicitando a misericórida do Deus Pai que me foi apresentado, anos atrás, lembrei do Nilson e sua brasilianidade. Então entendi. O Nilson era a encarnação do novo Deus, que veio, caminhou comigo e eu o desprezei, achando-o a cara do diabo. Meu Deus, como sou burro!

Lou Mello

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